sexta-feira, 13 de abril de 2012

Ó vos omnes qui transitis per viam...


        O momento que precede a Procissão do Senhor Morto é dos mais piedosos. Os irmãos do Convento do Carmo abrem as suas portas aos fiéis contritos que adoram e beijam a bela imagem do Crucificado que, numa concessão rara, desce do altar-mor de onde contempla os homens que passam.
        Enquanto isso, o corpo do Senhor Morto é velado em câmara ardente na igreja vizinha dos veneráveis irmãos terceiros carmelitas, responsáveis, há séculos, pela procissão. Em seu esquife de madeira e prata, Jesus mais uma vez morto repousa entre lágrimas e lamentos de beatos e passantes de nervos mais fracos. Toda a capela-mor é sobriedade, sendo o altar coberto pelo roxo que traduz o luto da Igreja pela morte daquele que, ressuscitado, será fundador e fundamento de religião milenar. Envolto em véu diáfano, o Filho do homem é pranteado e logo sairá na Procissão de Enterro, como foi chamada no passado, seguido pelo mesmo séquito de há dois mil anos, hoje representado aqui por membros das duas ordens carmelitas. A imagem exposta é de beleza ímpar e foi esculpida em 1758 - capo lavoro de Francisco das Chagas, o Cabra, filho de escravos de quem herdou o fado e a carta de alforria.
        Sob salva de tiros executados pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar, sai o cortejo às 16 horas. Como na idade Média, os sinos há dias foram silenciados, e é ao som da matraca que o povo acode organizando-se com precisão quase coreográfica. E seguem Ladeira do Carmo abaixo, em trajeto modificado pela reforma da Igreja do Passo. A matraca anuncia aos locais a passagem do santo cortejo e um sincronizado debruçar-se em janelas confere mais vida a procissão. Depois são circunstantes que se ajuntam ao longo do caminho e, no Largo do Pelourinho, a multidão já se avoluma. Dos bares abertos, copos de cerveja se elevam em saudação. Estamos na Bahia e nada há que se estranhar que bêbedos, vadios e prostitutas compareçam de forma menos solene. Estes, alguns já tão crucificados em suas vidas diárias, são Cirineus que se juntam aos "cristãos oficiais" e, em seus corações, levam suas cruzes, silenciosos.
 
        Seguindo em direção ao Terreiro de Jesus, pessoas de todas as idades sobem e descem ladeiras com esforço gratificado pela honra de acompanhar seu Senhor em cada um dos passos de Sua Paixão. Amiúde, para-se para ouvir a Palavra. Novas salvas de tiros e todos seguem ao som de músicas piedosas. Ali, junta-se ao cortejo o Arcebispo Murilo Krieger com seu séquito diocesano. Toma a frente da procissão e pronuncia palavras autorizadas.
        A chegada ao Paço Municipal marca o fim da primeira parte do cortejo. A noite já chegou, prateada pela lua cheia. A multidão começa a se dissipar mesmo durante a fala do arcebispo. A sorveteria A Cubana enche-se em minutos. Estão todos cansados e sedentos. Jejuns quebrados, comem e bebem com prazer já não interdito pela Igreja.
        Muito me admiram as procissões. E encantam! Sendo alguém que, como diz Câmara Cascudo, é mais da fé que do rito, sou seduzida por movimentações populares, com especial predileção pelas de motivação religiosa. Nesta, cantei muito, acompanhei-a do começo ao fim, admirei a beleza plástica do evento, as forças dos rostos, a vibração da fé, o amor que une o povo de Deus, a vaidade que o separa. No entanto, posso dizer como o Pe. Antonio Vieira em seu fabuloso sermão do Terceiro Domingo da Quaresma (1655): "Nem louvo nem lamento - admiro com as turbas."

Helenita Monte de Hollanda

domingo, 8 de abril de 2012

Deus Vivo


Padre Monte, s.d.

Não basta aceitar a divindade do Messias, crendo na sua pessoa. É preciso também acreditar na sua missão, aceitando os seus ensinamentos. É preciso crer em Cristo e crer a Cristo. Contrassenso seria admitir que Ele é o Filho de Deus-Vivo e não se escutasse a sua voz, não se seguissem os seus ensinamentos, não se trilhassem os seus caminhos. Seria conhecer e precisar da luz e viver nas trevas, seria olhar as fontes da vida e sentir necessidade de se abeberar das águas e se deixar morrer de sede.



sábado, 7 de abril de 2012

O sentido da Santa Cruz

        Desejamos que a mensagem de hoje fosse curta - uma advertência, um conselho amigo do "sacerdote angélico".


        Quando o homem perde o contato com a Cruz Redentora ele se brutaliza: começa erguendo na própria alma um calvário, e para consolo desta agonia interior, seu primeiro impulso é levantar cruzes para seus irmãos, numa ânsia de extermínio. Recusando-se, em obstinada cegueira, a enxergar na cruz do Cristo a carta magna da confraternização humana, crucificam-se impiedosamente uns aos outros, arrastam-se em louca emulação, pelos caminhos torturantes de um outro calvário mais doloroso que o primeiro.
        É que o mundo se cobre de cruzes todas as vezes que se esquece da Cruz. E cada homem é um crucificado, preso à cruz da angústia e do desespero, no calvário imenso do mundo. Eles que tentaram alijar o peso suave da cruz redentora, puseram sobre os ombros o madeiro ingrato de todos os infortúnios.


sexta-feira, 6 de abril de 2012

A Cruz






Padre Monte, 1928

Os profetas haviam anunciado que o Messias, aquele de devia vir ao mundo para salvar a humanidade de todas as agruras e de todo o pecado, seria coroado de glória e de honra.
Diziam que ele seria conquistador extraordinário das multidões, rei sublime dos mundos. Diante dele, todos os povos se prostrariam de joelhos, sentindo a majestade de sua grandeza, e admirando o esplendor do seu poder.
Teria esse Messias a terra por escabelo a seus pés; os astros formariam a sua coroa resplendente; seria o seu manto triunfal o azul dos céus e dos mares.
Mas, oh decepção! Ilusória miragem de tantos séculos perdidos de espere inútil! Triste realidade de um anseio infinito! Dolorosa angústia de corações cansados de sofrer!
O homem se deixa flagelar submissamente, que consentia em suportar humilhado o peso de uma cruz para nela morrer, que não tinha um gesto de revolta contra os seus sicários impiedosos, não podia ser o Filho de Deus há tantos séculos anunciado.
Não será possível que aquele ente desventuroso, escarnecido pela turba, conduzindo o instrumento ignominioso de seu suplício fosse na verdade o enviado dos céus.
Como poderia um Pai consentir no sacrifício, no martírio, na dor sem tréguas de um Filho Dileto?
Como, sendo o Eleito de Deus, se sujeitava a passar por tantas degradações, a ser açoitado vilmente, a padecer os maiores insultos e chufas de míseros mortais, a receber passivamente as chicotadas de seus algozes.
Não, não podia ser o Filho de Deus quem oferecia o espetáculo mais aviltante aos olhares sequiosos da multidão que viu sair do Pretório o infeliz condenado que a infâmia do Senedrim e de Pilatos entregava pusilânime à senha dos judeus.
Não, não podia ser o Filho de Deus aquela pobre criatura fraca e incapaz de tolerar sobre seus ombros o madeiro que a sentença miserável entendera de impor-lhe, como se os seus julgadores quisessem mostrar às gentes estupefatas que não tinha realeza nem origem divina aquele que arrastava para o suplício o instrumento da própria morte.
Mas, oh milagre dos milagres!
Aquele lenho aviltante tornou-se o cetro do mais poderoso dos monarcas.
Aqueles dois pedaços unidos de madeira tosca não tardaram em ser o símbolo da redenção humana.
Aquele madeiro pesado converteu-se no lampadário do mundo.
Aquele instrumento de suplício passou a constituir o farol da esperança e da imortalidade.
Aquele patíbulo infamante mudou-se em estandarte glorioso desfraldado no país da santidade.
Aquela árvore da morte plantada no cinto do Calvário representa o candelabro imenso da teologia.
Aqueles braços abertos à contemplação do mundo são o grande livro da Fé ensinando a todas as gerações as verdades eternas do amor e do sofrimento.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

O Senhor Morto


Padre Monte, 1929
 Para o Calvário

Após o infinito percurso de dois mil anos, ainda esse pesar renasce vivo como se agora mesmo fosse produzido, e a emoção dos que a relembram na sinceridade de fé e do seu amor pelo Cristo, vibra-lhes intensamente na sensibilidade, na alma e no coração, como se pela primeira vez assistissem à tremenda tragédia do Gólgota.
A cena ressurge vívida à recordação do inenarrável suplício.
Descem como pequeninos rubis, as gotas de sangue precioso à fronte iluminada e bela, como implácido céu estrelejado, cingida da coroa irônica de lancinantes espinhos; as rótulas dilaceradas pelas quedas, em marcha da penedia sinistra, a boca exangue e luminosa entreaberta aos haustos extremos a uma asfixia que o oprime sob o peso do lenho descomunal, vai selar com a vida de exemplos e milagres a redenção do homem.
Toda a imensa dor humana, refulgente nesses belos olhos doces e claros, como sóis longínquos e melancólicos, pesava-lhe mais aos ombros marmóreos e sagrados, que o áspero madeiro que conduzia.
E por toda parte por onde aquela dor universal passava, assinalava de sangue precioso as estações que se repetiam às forças exauridas ao próprio espírito divino, para gáudio do ódio e da perversidade ingênitos, a piedade, a complacência, o perdão e o Amor ia semeando para frutificação do Bem e da Virtude.
Era a Verdade que, do cimo da penedia sagrada, na convulsão dramática do universo, no trágico e tremendo protesto da terra e dos céus, em face da insensatez humana ia irradiar-se, maravilhosamente, pelo mundo!
E após milênios passados, interroga a dúvida vencida à evidência dos fatos:
Que homem tão excepcional é este que, após vinte séculos do seu negregado suplício, ainda arrasta após ele, multidões inumeráveis e silenciosas, numa compunção profunda e sincera, comovida e lacrimosa?
Que homem é esse, que todos, moços e velhos, mulheres e crianças, cultos e bárbaros lhe sabem a história magnífica, única entre todas, na grandeza emocional dos seus atos, atitudes e ações?
Que estranha Criatura é essa, que todos lhe sabem o nome, o nascimento e a morte?
Que Sobre-humano é esse, que através da profunda mutação de séculos e séculos, reúne em torno de sua fé, de sua doutrina e de exemplos todas as raças e todos os povos da terra?!
Que Entidade tão extraordinária é essa que agita a ciência, a sabedoria e o pensamento humano e desperta em volta de si mesmo toda sorte das mais arrojadas hipóteses e audaciosas conclusões, para deixá-los, afinal, perplexos, indecisos, confundidos e postulantes da suprema evidência de sua divindade?!
É que Ele encarnara o sentimento humano nas suas aspirações de justiça, de perdão e de amor, de fé e de paz, de bondade e de esperança...

quarta-feira, 28 de março de 2012

Foi um tiro, Poeta!

O encontro entre o cineasta Billy Wilder e o poeta Vinícius de Moraes

Hollywood, 18 de abril de 1948. Em carta a sua mãe, D. Lydia, o poeta Vinícius de Moraes escreve pedindo-lhe com urgência que apure detalhes sobre um fato ocorrido em sua infância e sobre o qual ele lembrava de comentários em casa de Vovó Neném. Pedia o Vininha, no maior sigilo possível, que alguém da família pesquisasse nos arquivos da Biblioteca Nacional as notícias veiculadas na imprensa sobre um operário que caíra num esgoto no Rio de Janeiro e que morrera alguns dias depois, sem que ninguém o pudesse tirar de lá. “Dá um enredo formidável para um filme e tenho aqui alguém interessado na ideia, que me poderá dar bom dinheiro, que muitíssimo estou precisando”.

Vinícius estava em fase efervescente. Inspirado, escrevia “como um desalmado”. Foi a época, entre outros, de Pátria Minha, sensacional poema que exalta com críticas magoadas um Brasil cujos problemas acompanha de longe e que já não lhe alimenta ilusões políticas, mas que ama como só um exilado é capaz (“teu nome é Pátria Amada, é Patriazinha, não rima com mãe gentil.”). E assim, saudoso e inspirado, porém sempre em dificuldades financeiras, fazendo “bicos” que, como ele várias vezes admite, “o Itamaraty pode não gostar”, o poeta insiste em sua poesia. Não nascera para “lamber selos” e a sua alma livre pouco ou mal se acomodava ao cargo de diplomata. Assim é que ter alguém interessado em uma sua história, em um possível roteiro para o cinema enquanto escrevia a peça Orfeu, que parecia não ter fim nem muito menos data para ser encenada, era um presente dos céus. Animado, ele pauta, com detalhes, todas as informações que ele precisa para escrever o seu filme. “É a história do século, porque é simbólica dos tempos que correm, e cheia de tragédia e suspensão.”

A história não registrou se os dados foram coletados pela família e enviado a ele nos Estados Unidos. Pelo menos nada encontramos em sua correspondência tão bem organizada por Ruy Castro em Querido Poeta. O que sabemos do episódio ocorrido no Rio é o que o próprio Vinícius conta: um operário caíra no esgoto, houve mobilização popular, brigas entre os Corpos de Bombeiros de Rio e São Paulo, grande repercussão na imprensa e um homem morto ao final de muito burburinho em jornais e telejornais. Não fizemos nenhuma pesquisa sobre o caso. Dele tivemos notícias no filme lançado três anos depois da referida carta – A Montanha dos Sete Abutres, de Billy Wilder, em 1951, temperado com pitadas do imaginário religioso do Novo Mexico, onde a trama se desenrola. Todas as perguntas pautadas por Vinícius para que a família pesquisasse no Rio de Janeiro estão lá, respondidas. Genialmente o diretor escandaliza o expectador com uma crítica ferrenha a um jornalismo existente, manipulável, sensacionalista, descomprometido com a verdade e assassino. Não é à toa que o protagonista Chuck Tatum (Kirk Douglas) anuncia a manchete de sua última matéria: “Repórter deixa homem enterrado por seis dias.”

Sobre as relações entre Vinícius e Billy Wilder, também nada sabemos. O nome do Poetinha Camarada não aparece nos créditos do filme, de modo a imaginarmos que o roteiro foi vendido juntamente com o direito autoral uma vez que três outros mestres o assinam – o próprio Wilder, Lesser Samuels e Walter Newman. Mas pouco ou nada interessava ao diplomata atolado em dívidas cujo sonho revela em carta do mesmo ano ao amigo Manuel Bandeira era apenas - “Quero positivamente viver sem dívidas”.

Se é triste vender uma obra, não o é menos ter dívidas vencidas. Vinícius estrebuchava para viver. Mas que fique entre nós o registro para a justiça e satisfação do “branco mais preto do Brasil”, do poeta e diplomata Vinícius de Moraes: que ele intuiu profeticamente, informou-se com perspicácia e escreveu com elegância o roteiro do filme (ou da história) vendido. Mais uma vez ele estava certo e não era à toa que pedia em foma de apelo: “Minha mãezinha, preciso disso como de ouro. (…) Estou ardendo para começar a pegar a coisa porque, ou muito me engano, ou vai ser um tiro.”
Foi um tiro, Poeta!
Helenita Monte de Hollanda


sábado, 10 de março de 2012

As Mulheres da Minha Vida


É verdade que "pedra que muito se muda não cria limo". Sou dessas pedras. Muitas vezes endurecida pelas calosidades de árdua caminhada, sou dulcificada por seres humanos inesquecíveis que cruzam o meu caminho. Dra. Rapadura - dura e doce. Sempre achei graça por me dizerem assim. 

Mas há vantagens em tal caminhada - cruzei com muita gente boa. Pessoas que deixei em cidades onde provavelmente não voltarei, mas que fizeram de mim um ser humano menos egoísta servindo-me de exemplo na busca de ser alguém mais útil na construção de um mundo melhor. Conheci mulheres notáveis em todos os lugares por onde andei e é delas que quero falar aqui, é para elas que vai a minha homenagem na Semana Internacional da Mulher.


Mães, irmãs, filhas... Quantos braços abertos me acolheram? Quantas palavras sábias me deram luz? Quantos exemplos de força me fizeram humilde? Quantas demonstrações de superação me deram coragem?... Não há como não ser eternamente grata.

As mulheres da minha vida são as mulheres da vida e do mundo. São guerreiras vitoriosas em suas lutas diárias na educação dos filhos, na manutenção dos casamentos, na harmonia do lar, contribuindo com braços de ferro para o orçamento doméstico. São espíritos simples, sempre em prece de súplica e gratidão. São corações abertos, completamente livres para o amor e para o perdão, ocupados demais com a dramaticidade de suas vidas para se preocuparem com futilidades. São braços de ferro com mangas arregaçadas para qualquer tipo de trabalho necessário.

As mulhes que marcaram o meu viver pelas estradas da vida, guardam a alegria risonha de quem não tem medo. Suas cabeças erguidas não admitem o desrespeito. Conhecem seu valor e o valor de suas causas. Brigam como feras em defesa da honra própria, da dignidade própria. Dê-lhes montes de roupas para lavar, mandioca para ralar, roças para arar, plantar, colher, filhos para cuidar, gado para tanger... E lá estão elas sem tergiversar, sem queixumes. Alienadas? Não! Se injustiçadas, reclamam! Se exploradas, recusam-se! Se estimuladas, produzem! Se necessitadas, desdobram-se! Que mulheres! Não perdem a feminilidade nem uma saudável vaidade que muitas vezes me fez esperar que penteassem melhor os cabelos e até passassem batom antes de se deixarem fotografar. D. Lia comprou na feira um chapéu que lhe caísse bem para a colheita do feijão. D. Dete caprichou na padronagem da sombrinha que usava na roça em dias de muito sol. No frio e sem agasalho adequado, Fabiana improvisa com toalhas coloridas uma idumentária que a deixa tão linda!


As mulheres que conheci trabalham muito bem em equipe. Se D. Zilda vai colher a mandioca, é só avisar que logo 10-15 mulheres se reúnem para colher, descascar, ralar, lavar, fazer a puba, a farinha e a tapioca. A paga pode ser parte da produção ou retribuição em ajuda na plantação ou colheita. As coisas vão se resolvendo. Sabem vocês o que se dá embaixo de um pé de pau onde essas mulheres trabalham? Conversas, piadas, fofocas. Zombam umas das outras e de si mesmas, contam histórias do passado, rememoram lendas e causos contados pelas avós, ensinam umas às outras receitas, modos mais práticos de fazer coisas triviais. Adoram assuntos "picantes"! E para elas tudo que se refere a homem, a sexo, é suficientemente picante para provocar risinhos nervosos nas mais recatadas e grandes gargalhadas nas velhas sábias já consideradas acima de falsos moralismos e elegâncias inócuas.

Como são versáteis em seus saberes e habilidades! Em seus meios, são capazes de desenvolver grande variedades de ofícios, da lavoura a culinária, da lavagem de roupa ao artesanato, e o fazem enquanto cuidam de suas casas e dos filhos. E quantas linhas eu usaria para falar sobre sua criatividade, sua destreza para trabalhos delicados, sua "finura" para detalhes sofisticadíssimos das rendas e bordados...




Não, não me faltaram exemplos na vida! Conheci duas bisavós, Fausta e Maria, duas avós, Lia e Suzete, tenho uma mãe exemplar, Margarida, duas irmãs, Suzete e Sonja, que são mulheres da melhor cepa; tias e primas muito amigas, e todas as mulheres do mundo, do meu mundo, foram boas e belas. Agora tenho duas filhas, Lia e Teresa, e netas que ainda não são fatos, nem mesmo fetos, mas que já moram em meu coração dilatado, preparado no sagrado coração do arquétipo da Grande Mãe presente em todas as mulheres que cruzaram o meu caminho.